Não será com certeza preciso um nível de perspicácia muito elevado, mesmo para o mais inexperiente cinéfilo na matéria, para se aperceber da complexidade e profundidade inerente à filmografia de Hayao Miyazaki. Não me parece que o manto animado com o qual se cobre, engane muitos. As obras de Miyazaki dirigem-se sempre a um público mais adulto, compreensivo e mais perceptível.
A única excepção parece ser "Ponyo à Beira-Mar". Apesar de aparentar ser irrelevante, a ordem pela qual se visualizam pela primeira vez os filmes de Hayao Miyazaki é um factor importante para uma opinião prematura do trabalho do realizador.
Estou assim totalmente convicto de que ter iniciado a minha incursão pela filmografia de Miyazaki com este "Ponyo à Beira-Mar", não foi a melhor opção.
Trata-se de uma fita claramente infantil, focalizada para uma audiência cuja faixa etária já não me enquadra.
Talvez por isto mesmo eu me tenha sentido algo desconfortável após a visualização desta obra, estando convicto de que se trata de um filme de extremos.
A animação que Miyazaki proporciona é refrescante e quase inovadora. Optar (ou continuar a) pela clássica animação desenhada a 2D, em vez do recorrente efeito computorizado, tem como consequência uma óbvia nostalgia. É uma opção que revela honestidade e sabedoria e que, não se servindo dos seus antecedentes, é responsável por momentos de pura beleza e regalo visual.
Seria um crime não referir o aparecimento da mãe de Ponyo, num maravilhoso turbilhão colorido que enche de júbilo a mais insensível das almas.
No entanto, a meu ver e tal como outros géneros animados, tem as suas limitações. Aqui, cabe-me apontar o dedo a Hayao Miyazaki, que erradamente presumiu que a sua técnica animada era capaz de fazer jus ao pretendido, algo que se veio a revelar falso, uma vez que algumas (escassas, é certo, mas marcantes) cenas de "Ponyo à Beira-Mar", sobretudo no climax da tempestade, são... ridículas.
Apesar de tudo, pela intenção e por grande parte da concretização, "Ponyo à Beira-Mar" é um verdadeiro mar de beleza.
Não são, no entanto, apenas os olhos que comem. Também a nossa audição beneficia (e de que maneira) de uma banda-sonora tão inocente quanto tocante. Um trabalho magnífico.
A nível argumentativo, "Ponyo à Beira-Mar" é, clara e infelizmente, irregular. A sua premissa é interessante, mas pouco apelativa, e a sua conclusão previsível.
É o desenvolvimento que "borra a pintura", com o argumento a perder-se algures entre um surrealismo delicioso e uma banalidade aborrecida, na relação entre Ponyo e Sosuke, havendo mesmo espaço para uma ou outra cena dispensável e sem sentido.
Servindo-se, acredito que involuntariamente, da sua fruição visual (quase sempre ao mais alto nível), "Ponyo à Beira-Mar" é uma proposta que apenas poderá ser valorizada pelo lado mais infantil de todos nós.
1 Eloquentes Intervenções Escritas:
Manuel,
Em relação a não se encaixar na faixa etária, não me parece que os adolescentes sejam o público visado por Miyazaki nesta obra específica.
Por isso mesmo, e apesar de ser uma questão subjectiva, considero-a infantil.
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